Olhos cheios d'água - As Ruínas de Jorge

Oswaldo conseguiu fazer com que Jorge ficasse em sua casa. Na casa de Oswaldo. Jorge sempre fora um homem independente, obviamente não gostava de ficar na casa de outras pessoas por mais que algumas horas. Era chato e ele não tinha liberdade. Não podia deitar-se quando tinha sono. Tinha que esperar os donos da casa irem se deitar também. 
Oswaldo trabalhava de tarde em uma fabrica de parafusos e quando chegava em casa ainda ficava horas conversando com sua mulher. Juliana trabalhava durante o dia em uma loja de doces, às vezes chegava em casa à noite. A conversa do casal durava horas, era como e fosses recém casados, sempre tinham assunto um com o outro. Eles já estavam casados à seis anos. Nenhum dos dois queria filhos, nem animais de estimação.
Jorge passava os dias observando a vizinhança. Oswaldo e Juliana moravam em um condomínio fechado, onde havia várias casinhas bem acabadas. Jorge passeava pelas ruas analisando como aquelas casas haviam sido feitas, porque queria que a sua ficasse tão bonita quanto. Se conseguisse reerguer seu sobradinho.
O sobradinho de Jorge era todo verde e tinha os detalhes em branco. Logo depois da porta de entrada estar a escada que dava no andar de cima, do lado direito uma sala de estar que era pra receber os amigos e do lado esquerdo uma pequena cozinha americana. No andar de cima ficava o quarto de Jorge e o escritório onde escrevia seus artigos para a revista semanal de Guerrilândia. Jorge pretendia gerenciar dali o jornal de Guerrilândia. Como já tinha funcionários suficientes para fazerem o trabalho ele poderia passar mais tempo em casa. Era tudo o que queria. Depois de passar anos cobrindo reportagem de campo, indo de um lugar, às vezes sem nem dormir direito.
A fotografia danificada pelo fogo estava em seu bolso todo o tempo. Quase não dava pra enxergar o que havia nela, mas ele a segurava de vez em quando e ficava admirando os personagens que, à essa altura, só ele sabia quem eram.

Ao chegar o final de semana, Oswaldo levou Jorge até sua casa. A casa de Jorge. Oswaldo foi preparado para um dia longo de trabalho. E Jorge não estava mais tão ansioso. Estava calado no carro olhando sua fotografia. Quando olhou o entulho em que se transformara sua casa suspirou e Oswaldo tentou anima-lo.
_ Calma amigo, eu chamei algumas pessoas pra ajudar, daqui a pouco não vai ter mais bagunças nenhuma aqui.
_ Daqui a pouco não vai haver minha casa aqui...
_ Vamos, pegue as coisas que você quiser guardar e coloque lá trás.
Eles saíram do carro e os vizinhos de Jorge já estavam todos tirando o entulho de sua casa. Todos os homens usavam bermudas e alguns estavam em camisa. Euclides era o único que estava de calça comprida. Eles tiravam os tijolos e pedras e colocavam na caçamba. Jorge foi aos poucos se misturando aos homens e coletando seus objetos. A maioria já tinha perdido a forma e estavam todos chamuscados pelo fogo.

Jorge estava ouvindo o discurso animador de um de seus vizinhos quando viu um brilho no chão. No mesmo instante ele abaixou e levou a mão no meio das pedras. De lá tirou uma gargantilha preta que tinha algo parecido com um cristal pendurado.. Ele abriu um sorrio largo e seus olhos encheram de água.

As Ruínas de Jorge, Cap. 6

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