LEITURAS DE JUNHO

O mês de junho foi meio tenso com relação às leituras. comecei a fazer uma nova pesquisa para o próximo livro e isso me levou a ler um pouco mais devagar. Os primeiros livros que li esse mês foram "Onde estivesses a noite" e "Via crucis do corpo" da coletânea Todos os contos da autora Clarice Linspector, fiz um post somente sobre estes livros na semana passada porque queria fazer um comentário de toda a coletânea e a minha opinião sobre a autora. Leia o post no aqui.


Um dos livros que comecei a ler para o próximo livro é "A história do café", pretendo criar algo em torno dessa atmosfera do campo e da produção agrícola. Mas não vamos falar tão já sobre meu processo criativo. Escrito pela pesquisadora Ana Luiza Martins e publicado pela Editora Contexto, o livro conta toda a história do café, desde a sua descoberta no oriente, passando pelo "contrabando" do grão para as Américas, a introdução do grão no mercado brasileiro até a ascensão da produção nacional ao nível de maio produtor mundial da especiaria. Este deve ser considerado um livro paradidático; pois, apesar de trazer uma estética narrativa mais informal, é um estudo complexo e com uma riqueza de detalhes que satisfez minha curiosidade. É um ótimo livro para ser usado em estudos da construção e crescimento da população nacional. Muito da história do próprio país está diretamente relacionada ao grão. Mas não é um livro que se tome como uma cafezinho. Ele é denso e complexo como todo livro de história. A autora dividiu o livro em quatro partes: descoberta do grão, o grão na época do Império, o grão na República e as datas mais atuais. Isso ajuda a direcionar os seus estudos, se estiver focando em alguma época específica. Mas todo o livro tem conteúdo particularmente interessante, curiosidades sobre o grão, sobre a bebida, sobre a sociedade, sobre a corte portuguesa, sobre os barões do café e aí por diante. Várias personalidades importantes são citadas e há fotografias que retratam visualmente a sociedade daquelas épocas. Vale muito a pena ler, mesmo que você não goste de café.


Outro livro que li este mês foi um achado em um sebo. No mesmo dia que comprei o livro sobre a história do café, acabei encontrando sem querer "A história do leite" encostadinho ali no café. Nada sugestivo. Este livro é uma espécie de material promocional da Vigor. É um livro muito bonito, cor de leite gordo e recheado de fotografias lindas. Ele conta como as sociedades humanas começaram a consumir o leite animal e todas as lendas e tradições por trás desse costume. Além de detalhar os avanços tecnológicos na industria láctea. É um daqueles livros que servem mais para promover a marca, mas tem curiosidades interessantes para quem, como eu, é escritor e precisa de inspiração diária. Sem falar que caiu como uma luva esse café com leite.

Estou entrando numa fase muito mais histórica do que puramente literária, mas acredito que para valorizar a literatura nacional precisamos conhecer o país em que moramos e as origens das lendas em que acreditamos. Até mesmo para criar conteúdo original e com a cara do nosso Brasil e não simplesmente uma cópia xerocada de um produto americano. O nosso país tem muita história que vale a pena ser contada. 

RESENHA: TODOS OS CONTOS, CLARICE LINSPECTOR


Esse mês eu finalizei a leitura do livro/coletânea “Todos os Contos” dessa grande bruxa brasileira chamada Clarice Linspector. Agora sim eu tenho certeza de que essa mulher era uma bruxa. Mas vamos por partes, ok?


O penúltimo livro de contos da Clarice ( Clarice, assim, bem intimo mesmo, porque somos amigas agora), chama-se “Onde estivestes de noite” e é uma “viagem” ao que é atemporal e inexplicável. Nesse livro a feiticeira Linspector toca em questões que são muito abstratas e profundas como a própria existência. Os contos são muito sobre o tempo, como estamos usando o tempo e de que ele está passando. Ela ressalta aqui também que todos temos um animal dentro de nós – que na visão dela pode ser um cavalo, ou o homem é que está no cavalo – e que cada um de nós tem sua própria luta. Todos estamos em uma jornada que é individual e intransferível.



O último livro é intitulado “Via crucis do corpo” e foi considerado à época um livro pornográfico. Muito longe dos livros eróticos que lemos hoje, ainda é uma abordagem bem sutil. É uma seleção de contos reflexivos, mas sem pudor. Aqui a autora deixa-se livre para contar as histórias de mulheres que experimentara e usaram o corpo. Sem aquele pudor que dizia que a mulher tinha que cobrir o corpo, esconder a pele, ser casta e pura. As mulheres desses contos são prostitutas, bígamas, adúlteras, mulheres apenas que experimentam o próprio corpo como algo que é só delas e de mais ninguém. E por serem delas estes corpos, elas os compartilham com quem ou o que bem entenderem. São contos divertidos e profundos ao mesmo tempo. Todos muito sérios, mas sem o compromisso de ser levado a sério. Este é, pra mim, o melhor de todos os livros dessa coletânea, embora sejam todos muito bons.

O livro termina com três contos soltos, “Brasília”, “A bela e a fera ou A ferida grande demais” e “Um dia a menos”. De todos os contos desse livro o único que eu não gostei foi “Brasília”, não sei explicar, mas não gostei mesmo – não sei se do conto ou de Brasília. Talvez eu nunca vá à Brasília de qualquer forma. As “ultimas histórias” são dois contos, que como diz a nota bibliográfica, foram publicados postumamente e estão inacabados. Foram editados para a publicação, mas contém algumas inconsistências que a atora talvez pretendesse arrumar em uma revisão tardia. Mas nesses dois contos o organizador da coletânea concluiu com os temas que Clarice abordou em toda sua obra: o ovo, a mulher, a classe alta, o ser humano e a sua feitiçaria única. Essa questão do ovo volta mais amadurecida, o ovo sendo algo que é o começo, que é novo e que é eterno.

Todos os contos é uma obra de literatura fantástica. Mas é aquele fantástico brasileiro que une religião, alucinação e bruxaria. Em muitos dos contos é nítido que os personagens não estão encarando a realidade, mas algo que é surreal, inventado ou não. Em todos os contos a autora aborda a religião de alguma forma, seja apenas dizendo que o personagem foi à missa ou falando propriamente de Deus, mesmo que nem sempre com este nome. E tem uma coisa de bruxaria na autora que ela mesmo menciona em um dos contos e como é chamada por muitos dos que conhecem sua literatura. É sem dúvida uma autora de personalidade  voz próprias. Foi protagonista de sua história e a escreveu de próprio punho. O que mais posso dizer, sou fã.